Crédito tributário como requisito para início da representação para fins penais

A violação da súmula vinculante 24, diante da comprovação de inexistência de justa causa para continuidade de inquérito policial.

Uma empresa foi submetida à verificação fiscal através de agente fiscal, o qual procedeu a análise do livros e documentos da empresa, pelo ferimento da Súmula nº 24/STF, foi apresentada Reclamação junto ao Supremo Tribunal Federal.

Na referida auditoria fiscal, segundo a ótica do R. fiscal, foi constado que o contribuinte, fez sua opção pelo simples, alcançando um faturamento não amparado pela legislação, o que adveio sua exclusão da sistemática do simples, através do ato declaratório, referente aos ano-calendário 2004 e 2005.

Considerando a exclusão do simples, o contribuinte, foi intimada a apresentar sua escrituração contábil de forma que se poderia apurar o Lucro Real Trimestral para os referidos anos calendários.

Ao par disto, antes mesmo de qualquer certeza da liquidez das referidas infrações e os mencionados créditos tributários, foi oferecida uma Representação Fiscal Para Fins Penais, juntamente com documentos que a instruem.

Além do referido Processo Administrativo Fiscal, vinculados a ele restaram instaurados outros PAF’s, mas todos vinculados aos mesmos períodos fiscalizados.

Ou seja, verificando-se a Representação Fiscal para Fins Penais expedida pela Receita Federal do Brasil, congregava três Processos Administrativos Fiscais.

Contudo, restou defendido que não há crédito constituído em relação a todos, em razão que o processo administrativo principal (exclusão do simples), ainda não restou julgado pelo Conselho de Contribuintes.

Frisou-se, que o processo administrativo de exclusão do simples é o processo mãe, e que ainda não houve a constituição do crédito tributário, ao passo que, se for anulado, anulará os outros dois processos, decorrentes do primeiro.

Desta forma, a exclusão do simples nacional e seus efeitos retroativos, foram a causa primeira da existência da lavratura dos autos de infração quanto a constituição do IPI, IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

Ademais, o Delegado da Polícia Federal solicitou por meio do Ofício informações à Delegacia da Receita Federal do Brasil, acerca da data da constituição definitiva dos créditos tributários, contidos nos Processos Administrativos Fiscais vinculados à Representação Fiscal para fins Penais, cuja resposta foi encaminhada e consta que no processo administrativo principal que deu causa aos demais, não houve à constituição definitiva.

A decisão que violou a Súmula Vinculante 24 – Investigação Policial instaurada antes da constituição definitiva do crédito tributários

Por tais razões, restou comprovado que inexiste justa causa para a continuidade do inquérito policial, primeiramente, porque o processo administrativo que deu causa aos outros processos, – ainda não foi julgado definitivamente, e segundo, porque pende dúvidas do trânsito em julgado de um dos processos administrativos.

Ainda, para que eventualmente possa existir responsabilidade criminal dos sócios, administradores, etc., necessário que a autoridade fazendária noticie o Ministério Público acerca da prática de crime contra a ordem tributária, o que é feito através da “Representação fiscal para fins penais”. Tal representação somente pode ser feita após ser proferida, na esfera administrativa, a decisão final sobre a existência de crédito tributário.

Neste sentido, leciona Suzane de Farias Machado Moraes:

“Mesmo tratando-se de crimes formais ou de mera conduta, tanto quanto os crimes materiais definidos no art. 1º, os do art. 2º da Lei nº 8.137/90 necessitam da existência de um tributo devido. É preciso que exista o crédito tributário para que se possa falar em condutas tendentes a não os pagar ou pagar a menor. É necessário também que o resultado tenha sido obtido por meio de fraude e que o sujeito tenha a intenção de não pagar o tributo ou pagá-lo a menor, o que os torna dolosos. Se para a configuração dos crimes contra a ordem tributária, materiais ou formais, é preciso que exista um tributo devido, faz-se também indispensável ter havido o lançamento.” (“Prévio esgotamento da via administrativa como condição para a ação penal nos crimes contra a ordem tributária”. In Revista Dialética de Direito Tributário, nº 97. Outubro de 2003. pp. 87-88).

Outra não é a lição de Hugo de Brito Machado:

“Nos crimes contra a ordem tributária tem-se, para a configuração do tipo, a necessidade de afirmação, pela autoridade administrativa competente, da existência de tributo devido, para que se possa no juízo penal afirmar a ocorrência da conduta consistente na supressão ou redução de tributo, e assim tipificado o crime.

Podemos, portanto, afirmar que é exatamente em atenção ao princípio da autonomia das instâncias que não se pode admitir o desencadeamento da jurisdição penal antes de que se tenha manifestado a autoridade administrativa.

Pudesse o juiz penal dizer que se configurou o crime de supressão ou redução de tributo, sem respeitar a competência da autoridade administrativa para dizer se no caso existe ou não existe um tributo devido, elemento normativo daquele tipo penal, estaria violada a autonomia das instâncias. A instância judiciária teria penetrado na instância administrativa. Teria feito afirmação que constitui atribuição própria daquela.

E não se trata de mera questão formal. Trata-se na verdade de uma questão substancial da maior importância, relacionada à especialização das funções do Estado. Enquanto cobrador de tributos o Estado age corporificado por órgãos especializados nessa tarefa. Do mesmo modo, enquanto outorgante de incentivos fiscais para o desenvolvimento econômico, o Estado age corporificado por órgãos especializados nessa atividade.

A constatação da ocorrência das condutas que tipificam os crimes contra a ordem tributária constitui atribuição da autoridade administrativa. Em respeito à autonomia das instâncias, o Estado, no exercício da jurisdição penal, somente pode agir quando esteja constatada e afirmada, pela autoridade competente, aquela conduta que atinge a integridade da ordem tributária, objeto jurídico protegido nesses tipos penais”. (Crimes contra a ordem tributária. São Paulo: Atlas, 2008, p. 270).

Dessa forma, percebe-se que a exigibilidade do crédito tributário somente será definitiva quando esgotadas as instâncias administrativas e os meios recursais cabíveis, somente sendo possível cogitar de crime contra a ordem tributária quando finalizadas todas as disposições sobre o lançamento do crédito tributário.

Por tais razões, tal situação afronta a Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal, qual menciona desde 2009:

SÚMULA VINCULANTE 24 – Crime Contra a Ordem Tributária Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo. Data de Aprovação 02/12/2009.

Realmente, segundo a súmula vinculante 24 do STF, “não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.

Destarte, enquanto não ocorrer o lançamento definitivo, haverá comportamento desvestido de tipicidade penal, o que evidencia a impossibilidade jurídica de se adotar, validamente, contra o (suposto) devedor, qualquer ato de persecução penal, seja na fase pré-processual (inquérito policial), seja na fase processual, pois, como é sabido, comportamentos atípicos não justificam, por razões óbvias, a utilização, pelo Estado, de medidas de repressão criminal.

Dr. Juarez Casagrande

Dr. Juarez Casagrande

ADVOGADO

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